Galileu: Conheça a Inteligência Artificial desenvolvida pelo TRT-RS que despertou a atenção do STF

16 out 2024

O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS) deu um passo significativo em direção à modernização dos processos judiciais com o desenvolvimento do sistema Galileu, uma ferramenta de inteligência artificial (IA) que promete otimizar a produção de minutas de sentenças.

A inovação, concebida em 2023, surgiu a partir de um estudo técnico realizado pela Coordenadoria de Desenvolvimento de Sistemas da Secretaria de Tecnologia da Informação e Comunicações (Setic), com o objetivo de identificar tecnologias emergentes aplicáveis à Justiça do Trabalho.

A iniciativa foi, então, integrada como projeto do Laboratório de Inovação do TRT-4 (Linova), e se iniciou o desenvolvimento. O projeto, além de representar um avanço tecnológico, também responde à crescente demanda por maior eficiência nos trâmites judiciais.

O sistema Galileu foi criado para reduzir o volume de tarefas burocráticas enfrentadas pelos magistrados e servidores, no que diz respeito à elaboração de minutas de sentenças. A IA é utilizada para realizar uma leitura automática das petições iniciais e contestações, identificando os pedidos e apresentando resumos e sugestões de subsídios. Com isso, busca-se não apenas agilizar o processo decisório, mas também garantir maior padronização e segurança jurídica na produção das sentenças.

“Identificamos a aplicabilidade da IA generativa para automatizar, mesmo que em parte, a minuta de decisões”, destaca o diretor da Setic, André Farias.

Desde seu desenvolvimento, o sistema vem sendo testado em fases piloto, envolvendo juízes e suas equipes. A fase inicial contou com a participação de quatro magistrados, e agora já se encontra em sua segunda etapa, ampliada para sete juízes. Esses testes têm como objetivo validar a eficiência da ferramenta e preparar o terreno para sua futura implementação em larga escala, prevista para beneficiar todos os magistrados do TRT-RS.

“Estamos focados na validação do produto, ampliando testes para logo termos condições de disponibilizar a todas as juízas e juízes de primeiro grau”, ressalta o juiz auxiliar da Presidência e coordenador do Linova, Rodrigo Trindade. (confira abaixo a entrevista com o juiz Rodrigo Trindade)

Além da aplicação imediata, o Galileu possui grande potencial de expansão. O Tribunal já firmou acordo de cooperação técnica com o Supremo Tribunal Federal (STF)Abre em nova aba, neste ano, para compartilhar o código-fonte do sistema, permitindo que a IA seja adaptada para o contexto de outros tribunais. Esse acordo reflete o compromisso do TRT-RS em contribuir para o avanço do uso de tecnologia no Judiciário brasileiro, projetando um futuro em que ferramentas de inteligência artificial terão papel central na justiça, mas sempre com a supervisão humana.

Saiba mais sobre o Galileu, nesta entrevista com o juiz Rodrigo Trindade:

Informações Gerais

O que é o sistema Galileu e qual sua principal finalidade?

O Galileu é um sistema informatizado que utiliza inteligência artificial para apoiar etapas da produção de sentenças, especialmente sumarizações e pesquisas de subsídios. No atual estágio, destina-se às minutas de sentenças trabalhistas, mas outras funcionalidades estão previstas para desenvolvimento próximo.

Quando o sistema Galileu foi criado e quem foram os responsáveis pelo seu desenvolvimento?

Em julho de 2023, foi formado grupo técnico com o objetivo de estudar a tecnologia de IA generativa e sua aplicação na Justiça do Trabalho. O grupo foi composto por cinco membros da Coordenadoria de Desenvolvimento de Sistemas da Setic: André Farias, Felipe Levin, Frederico Cardoso, Juliano da Silveira e Paulo do Carmo.

O estudo realizado concluiu que a tecnologia de IA generativa era potencialmente adequada para ser utilizada na elaboração de minutas de relatórios de sentenças. Esse estudo foi apresentado ao Comitê de Inovação, que aprovou o início do projeto para o desenvolvimento de um protótipo com essa finalidade, no âmbito do Laboratório de Inovação (Linova), sob a minha coordenação. A partir de então, o Linova foi responsável por organizar a equipe, conduzir os pilotos de teste, produzir manuais, fazer avaliações e validar versões. Todo o trabalho vem sendo conduzido com total apoio da Administração do TRT-RS, especialmente do presidente, desembargador Ricardo Martins Costa.

Quais órgãos ou equipes estão envolvidos no desenvolvimento e implementação do sistema Galileu?

Atualmente, o desenvolvimento do sistema é de responsabilidade do Linova, com apoio da Setic do TRT-RS. Por meio de acordo de cooperação técnica, o Supremo Tribunal Federal acompanha os trabalhos.

O sistema está atualmente em fase de testes. Em que fase piloto ele se encontra?

O sistema está em fase de pilotos, para avaliação de uso por usuários finais. Já foi concluída a primeira etapa com quatro juízes e, atualmente, temos sete magistrados e suas equipes testando o protótipo aperfeiçoado. Espera-se terminar esse segundo piloto em quatro semanas. Depois disso, o protótipo volta para reavaliação técnica e negocial.

Aspectos Técnicos e Funcionais

Como a inteligência artificial é utilizada no sistema Galileu para auxiliar os magistrados?

A IA é empregada para ler linguagem natural de petições iniciais, respostas dos réus e atas de audiências. Também utiliza leitura de dados estruturados do processo. A partir desse conjunto de informações, é capaz de realizar uma série de operações para auxiliar na produção da sentença: apresenta minuta de relatório, sugere esqueleto da sentença com nominação de capítulos, sumariza pretensões e respostas. Por fim, a partir de um banco de dados controlado e integralmente indexado, sugere subsídios potenciais de fundamentação.

Que tipo de tarefas burocráticas o sistema Galileu automatiza?

Sinteticamente, o Galileu foi pensado para a libertação de tarefas repetitivas e burocráticas, especialmente de sumarização de pretensões e defesas, bem como de pesquisas de subsídios. Tradicionalmente, julgadores precisam fazer pesquisas longas, repetitivas e demoradas, em diversas ferramentas informatizadas, procurando subsídios já existentes de fundamentação. O Galileu fornece minuta de relatório, de divisão da sentença, de sumarização dos temas e ainda indica subsídios para fundamentação da sentença, a partir de uma única pesquisa automatizada em banco de dados controlado.

O sistema realiza alguma forma de análise jurídica ou decisão sobre o caso, ou apenas auxilia no processo?

O Galileu não realiza análises jurídicas, não avalia provas, nem toma decisões. Ele apenas gera minutas e apresenta sugestões de subsídios potenciais, que são obrigatoriamente revisadas e avaliadas pelos magistrados, a partir de sua leitura do processo.

Quais são as fontes de subsídios utilizadas pelo Galileu para apoiar o processo decisório?

Para evitar as chamadas alucinações de IA, todas as fontes de subsídios utilizadas pertencem a textos gerenciados e armazenados pelo Pangea e seus módulos: precedentes qualificados pelo Pangea Precedentes, modelos do gabinete do juiz pelo Pangea-Gab e textos da Pesquisa da Secretaria de Recurso de Revista pelo Pangea+.

O sistema permite edição completa das sugestões feitas? Como funciona a revisão humana do conteúdo gerado?

O Galileu não produz partes prontas e acabadas de qualquer etapa da sentença. Conforme orientação da Resolução CNJ 332, de 2020, todos os textos são editáveis e dependem de revisão humana. O magistrado, portanto, sempre é responsável por validar, adaptar ou rejeitar as sugestões apresentadas.

Desenvolvimento e Inovação

Qual foi o principal motivo que levou o TRT-RS a desenvolver o sistema Galileu?

Para seguir atendendo seus compromissos com a sociedade, o Tribunal viu a necessidade de melhor responder às demandas por celeridade, organização e racionalização do trabalho. Também compreendeu que o uso de IA para a atividade judiciária deve passar por ferramentas internamente desenvolvidas, validadas e seguras.

Quais foram os maiores desafios encontrados durante o desenvolvimento da ferramenta?

Em termos gerais, o uso de IA ainda se inicia por todo o planeta, e é terreno que seguirá em desenvolvimento fértil por bastante tempo. Não há notícias de uso no Ocidente de ferramenta com escopo equivalente ao Galileu, que une funcionalidades generativas e de pesquisa automatizada em banco de dados completo e seguro. Todo esse ineditismo deixa o desenvolvimento mais difícil e desafiador. Particularmente, a característica de ampla cumulação objetiva das demandas trabalhistas levou a um grande desafio na identificação de tópicos dos processos. Cada petição tem sua forma de organização e apresentação de fatos e fundamentos, e foi preciso criar fórmulas de identificações mais amplas.

Quais benefícios o TRT-RS espera alcançar com o uso do sistema Galileu?

Espera-se reduzir tarefas burocráticas, como sumarizações e a passagem por circuitos repetitivos de pesquisas manuais para avaliação dos subsídios de fundamentação. Ao conseguirmos abreviar essas fases, sem perda de qualidade, podemos deixar mais tempo e disposição para as etapas mais intelectualizadas da produção de sentenças, especialmente para reflexões e análises probatórias.

Quais são as próximas evoluções ou atualizações previstas para o sistema?

No momento, estamos focados na validação do produto, ampliando testes para logo termos condições de disponibilizar a todas as juízas e juízes de primeiro grau. Mas logo projetamos a ampliação do escopo, criando versão que permita auxiliar na produção de acórdãos. Em paralelo, seguimos atentos a todo o dinamismo que envolve o uso de inteligências artificiais. Novas funcionalidades e aperfeiçoamentos estão sempre em avaliação.

Acordo de Cooperação com o STF

Qual é a importância do acordo de cooperação técnica firmado entre o STF e o TRT-RS?

O compartilhamento de informações e recursos são condições essenciais para qualquer desenvolvimento tecnológico. Ainda mais quando se trata de algo tão disruptivo como a IA. A colaboração com o Supremo parte dessa visão e busca otimizar esforços para que possamos criar ambiente de testes em tecnologia que poderá bem servir ao Judiciário Brasileiro. É possível que, a partir desse campo de experimentação, diversas outras funcionalidades poderão ser desenvolvidas, por diversos tribunais, e com segurança para todos.

Como será realizado o compartilhamento do código-fonte do sistema Galileu entre os dois tribunais?

O código-fonte já foi compartilhado e fizemos reuniões técnicas para esclarecimentos. A cada atualização no Galileu, o STF será informado. Também o TRT4 deve receber relatos sobre as experiências análogas por parte do Supremo.

Quais adaptações o STF pretende fazer para utilizar o Galileu em sua estrutura?

O STF poderá adaptar a tecnologia empregada no Galileu para atender à sua realidade processual específica.

O acordo envolve algum tipo de transferência financeira entre os tribunais?

Não, o acordo não envolve qualquer transferência financeira. Os trabalhos são desenvolvidos com recursos próprios.

Ética e Controle

Como o TRT-RS garante o controle ético e jurídico no uso da inteligência artificial no sistema Galileu?

O sistema não utiliza dados pessoais, e o magistrado tem total controle sobre a aplicação dos subsídios. Também observamos todas as orientações da Resolução 332 de 2020, do CNJ. Ou seja, as funcionalidades se submetem aos direitos fundamentais, fundam-se na segurança jurídica e igualdade de tratamento. E, acima de tudo, todas as etapas e recursos do Galileu garantem ampla revisão humana.

De que maneira o TRT-RS assegura que o sistema siga as diretrizes de linguagem simples e facilite a inteligibilidade das decisões judiciais?

O Conselho Nacional de Justiça, o Supremo Tribunal Federal e todos os demais tribunais brasileiros, incluindo o TRT4, têm um firme compromisso com a linguagem simples. Isso não significa vulgarizar a comunicação jurídica, mas permitir que as decisões sejam efetivamente acessíveis aos jurisdicionados. O Galileu segue essa orientação e está programado para produzir textos simples e de fácil compreensão, com frases curtas, objetivas e com termos acessíveis para a população em geral.

Futuro do Galileu e Expansão

Existe a intenção de expandir o uso do Galileu para outros tribunais além do STF? Quais seriam os benefícios disso?

Sim. Embora a ferramenta tenha sido criada e pensada originalmente para a Justiça do Trabalho de 1º Grau, pode ser facilmente adaptada para os demais ramos do Judiciário e outros graus de jurisdição. Ela já foi apresentada para o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) para potencial expansão.

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 4ª Região Rio Grande do Sul, por Eduardo Matos, 15.10.2024

Os artigos reproduzidos neste clipping de notícias são, tanto no conteúdo quanto na forma, de inteira responsabilidade de seus autores. Não traduzem, por isso mesmo, a opinião legal de Granadeiro Guimarães Advogados.

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