A 4ª Câmara do TRT-15, por unanimidade, negou o recurso da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU) e condenou a empresa a pagar indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 200 mil por manter empregados em condições análogas à de escravo. O acórdão, de relatoria do juiz convocado Carlos Eduardo Oliveira Dias, manteve também, pelo mesmo motivo, a condenação imposta pelo Juízo da 6ª Vara do Trabalho de Campinas em R$ 1 milhão à empresa Viasol (primeira reclamada).
Segundo os autos, o Ministério Público do Trabalho ajuizou ação civil pública contra a construtora Viasol e a CDHU, com base em uma denúncia de um empregado da construtora que trabalhava nas obras da CDHU, relatando que a empresa cometia diversas irregularidades em relação ao pagamento de direitos trabalhistas, condições de trabalho e alojamento de seus empregados, inclusive proibindo os trabalhadores de voltarem para seus estados de origem, Maranhão e Bahia. Pediu, assim, a condenação das empresas ao pagamento de indenização por dano moral coletivo.
O juiz da 1ª instância, Rafael Marques de Setta, constatou que os trabalhadores foram aliciados para trabalhar como empregados da empresa Viasol, a maioria em obras da CDHU, com promessa de pagamento correto de salário e boas condições de trabalho e alojamento. Porém, especialmente a partir de 2018, passaram a enfrentar problemas, como o recebimento atrasado e parcelado de salário, falta de pagamento de horas extras, desvio de função, trabalho sem o fornecimento adequado de EPI, descontos pelo fornecimento de passagens, alimentação e alojamento, tendo sido deixados à própria sorte, sem o recebimento de salário e verbas rescisórias, em condições precárias de habitação.
O MPT e a CDHU recorreram, o primeiro pedindo o aumento da condenação da CDHU para R$ 1 milhão e, a segunda, negando a indenização. A decisão de 1º grau foi mantida. Segundo o acórdão, “o que se verifica é que a CDHU fez vistas grossas à situação precária vivenciada pelos empregados da Viasol, o que não se pode admitir”.
O colegiado, no mesmo sentido do Juízo de primeira instância, afirmou que “somente com a responsabilização de todos os envolvidos em situações ilícitas como a do processo, trabalho em condições degradantes e análogo à de escravo é que se poderá pôr freio a situações desastrosas como as comprovadas no processo, não só para os trabalhadores envolvidos, mas para toda a sociedade”. Sobre a ilicitude cometida pelas empresas, o acórdão afirmou que “o bem jurídico tutelado é a dignidade humana do trabalhador e não apenas a liberdade”, e nesse sentido, “colocar trabalhadores recrutados de outros estados em alojamentos sem observância das normas básicas de saúde, higiene e segurança, como constatado pelas fiscalizações, afronta a dignidade humana e reduz o trabalhador a condição análoga à de escravo”.
A decisão colegiada também ressaltou que o fato de os recursos da CDHU serem públicos “não afasta sua responsabilidade, mas agrava a situação”, uma vez que “há nítido desvio de finalidade do dinheiro público empenhado, pois acabou por ser utilizado contra a própria sociedade, que não concorda com a exploração de trabalhadores da forma como verificada no processo”.
Por fim, o acórdão concluiu que “a situação de fato se enquadra aos termos do artigo 2º da Convenção nº 29 da Organização Internacional do Trabalho, que veda todo trabalho ou serviço exigido de uma pessoa sob ameaça de uma pena qualquer e para o qual não se tenha oferecido voluntariamente”, tendo “havido ofensa à dignidade da pessoa humana que, como é cediço, é um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito”. (Processo nº 0010245-11.2021.5.15.0093).
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 15ª Região Campinas, 08.06.2022
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