A Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) considerou discriminatória a demissão de uma empregada pela Vale e condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais. A dispensa se deu sob a justificativa de altos salários, mas, de acordo com relator do processo, desembargador Cláudio Armando Couce de Menezes, ficou provado nos autos que havia homens no mesmo setor com salários superiores ao das mulheres.
A condenação também se deu por outro motivo: a empregada alega ter sido convocada para atuar no pós-desastre de Brumadinho, mesmo a empresa tendo conhecimento de que ela sofria de ansiedade. Segundo a trabalhadora, o fato de não ter recebido treinamento pela Vale e ter ouvido muitos relatos trágicos diariamente fez piorar o quadro de saúde.
Quadro de ansiedade
O relator do acórdão, desembargador Cláudio Armando Couce de Menezes, explica em sua decisão ter feito um julgamento sob a perspectiva de gênero. Segundo o magistrado, a assistente social, ao ser deslocada pela empresa de seu local de trabalho em Vitória/ES para prestar suporte às pessoas atingidas pela tragédia, prestando auxílio sob as mais variadas formas, ouvindo dramas pessoais e coletivos, amparando as famílias em desespero, suportou uma imensa carga negativa, muito além do exigível no desempenho normal de suas atividades.
“Os sentimentos de tristeza, a angústia, ansiedade evidenciados pela reclamante são constrangimentos que violam a honra subjetiva e tal violação configura dano moral.”
Dispensa discriminatória
Testemunha ouvida no processo disse que havia empregados do sexo masculino no mesmo setor da assistente social, com salários cerca de três vezes superior, não tendo sido dispensados, o que contraria a justificativa da empresa de altos salários como motivo de demissão. Para o relator, houve dispensa discriminatória em função do gênero.
“A conduta da reclamada reforça a existência das diferenças e desigualdades historicamente direcionadas ao sexo feminino no âmbito das relações laborais, abrigando a manutenção estrutural da discriminação da mulher, arraigada no seio da sociedade brasileira há tempos. Ora, se o motivo da dispensa no setor eram os altos salários, por que então foi preservado emprego do trabalhador de sexo masculino que sabidamente auferia remuneração três vezes superior?”, ressalta Couce em sua decisão.
Ao condenar a empresa pela dispensa discriminatória, o relator citou a Lei 9.029/95, que assim determina, em seu art. 1º:
Art. 1º Fica proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso a relação de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de proteção ao menor previstas no inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal.
O magistrado também cita os princípios fundamentais da Constituição Federal, em especial os da igualdade, da dignidade da pessoa humana e da liberdade de trabalho; a Convenção 100 da OIT, sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW); e o Protocolo do CNJ para julgamento com perspectiva de gênero 2021.
Acórdão
Em sessão extraordinária virtual da 1ª Turma do TRT-17, com início em 17/8 e término em 22/8, sob a Presidência da desembargadora Wanda Lúcia Costa Leite França Decuzzi, a desembargadora Alzenir Bollesi de Plá Loeffler e os desembargadores Cláudio Armando Couce de Menezes e Valdir Donizetti Caixeta condenaram a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 200.000,00.
A sentença em primeira instância havia sido proferida pelo juiz Maurício Cortes Neves Leal, da 10ª Vara do Trabalho de Vitória. Ainda cabe recurso.
Processo: 0000065-63.2023.5.17.0010
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 17ª Região Espírito Santo, 27.09.2023
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