Não há como se acolher que o trabalhador peça demissão, sem qualquer prova de vício de vontade sobre esse ato (coação) e, meses depois, alegue responsabilidade da empregadora por sua decisão. Com base neste entendimento, o juiz do Trabalho Raimundo Dias de Oliveira Neto, em sentença proferida na 1ª Vara do Trabalho de Sobral (município da região norte do Ceará), julgou improcedente o pedido formulado por um servente de pedreiro que, em reclamação trabalhista, alegou frequentes atrasos no pagamento do salário para ter reconhecida a rescisão indireta do seu contrato de trabalho, também chamada de justa causa do empregador.
Atraso frequente no pagamento do salário se insere no artigo 483, “d”, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), segundo o qual “o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: […] não cumprir o empregador as obrigações do contrato”, tendo em vista que o pagamento da contraprestação pelo trabalho realizado, até o 5º dia útil do mês seguinte ao trabalhado, é a principal obrigação patronal.
No processo em questão, segundo o magistrado, o trabalhador informou que a empresa Constram – Construções e Aluguel de Máquinas Ltda-ME, sua empregadora, prometera pagar horas extras e adicional de insalubridade e oferecer alimentação, transporte e alojamento adequado, “entretanto, pouco disso ocorreu”. Assim, afirmou que não pretendia indiretamente rescindir o contrato, mas se utilizou do direito previsto no artigo 483 da CLT devido ao descumprimento reiterado das obrigações do contrato.
Ocorre, porém, que, na defesa, a Constram esclareceu que, quatro meses antes de ajuizar a ação em que alegou descumprimento das obrigações contratuais como justificativa de sua saída, o trabalhador apresentara pedido de demissão escrito e assinado de próprio punho, subscrito por duas testemunhas, alegando “motivos pessoais”. O documento foi juntado ao processo pela empregadora. Além de não se manifestar, depois disso, sobre o referido pedido, o trabalhador também deixou de comparecer à audiência em que seriam coletadas as provas testemunhais e depoimentos pessoais das partes e não apresentou qualquer prova documental de suas alegações.
Ademais, o trabalhador pedira o pagamento de horas extras, adicional de insalubridade e adicional noturno, mas o único contracheque juntado por ele e os demais contracheques apresentados pela empresa indicaram, em verdade, que houve os pagamentos, conforme alegara a Constram. A ex-empregadora também apresentou cópias das folhas de ponto, relatórios de horas extras e compensações (folgas), acordo individual de compensação (banco de horas), certificados de treinamentos e relatórios de entrega de equipamentos de proteção individual (EPIs). Além disso, a perícia realizada por profissional indicado pelo juízo apontou que inexistiam condições técnicas de insalubridade, sendo indevido o adicional correspondente.
“O autor nem de longe se desincumbiu do ônus da prova das alegações de descumprimento das obrigações por parte do empregador que justifique a rescisão indireta requerida, seja em relação ao atraso no pagamento de salários, seja em relação a desvio ou acúmulo de funções ou quanto ao não fornecimento de EPIs”, concluiu Raimundo Neto.
Na sentença, ele mencionou decisões anteriores do Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região em que, havendo pedido de demissão sem comprovação de vícios de consentimento, esta forma de término do contrato de trabalho é a reconhecida nesses casos. Os pedidos do autor foram, assim, julgados improcedentes.
A parte autora deixou transcorrer o prazo legal sem apresentar recurso, tornando definitiva a sentença no dia 6 de junho.
Processo: 0000591-98.2022.5.07.0024
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 7ª Região Ceará, 12.07.2023
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