Em uma sentença que segue o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a juíza Tâmara Gil Kemp, titular da Vara do Trabalho do Gama, deferiu o pagamento de indenização por danos morais – arbitrada em pouco mais de R$ 22,5 mil – para uma trabalhadora que sofreu assédio moral no ambiente de trabalho. De acordo com a magistrada, após sofrer vários casos de agressão verbal, a trabalhadora tentou denunciar o ocorrido aos superiores, mas a empresa não tomou nenhuma providência.
Contratada como analista de recursos humanos, a trabalhadora conta que sofreu assédio moral durante todo o período que trabalhou na empresa. Ela narra, na reclamação, diversos episódios, incluindo uma vez que ouviu o assediador tratá-la aos gritos, de forma descontrolada e ameaçadora, em um momento em que ela se encontrava grávida de sete meses. Segundo a trabalhadora, era comum ouvir expressões como “mulher é burra” ou “mulher tinha que ser levada no cabresto”. A empresa negou a ocorrência de assédio, afirmando que as cobranças, no trabalho, existiam dentro dos padrões de normalidade e razoabilidade.
Na sentença, a juíza lembra que o assédio moral se configura pelo procedimento reiterado do empregador de submeter o empregado ou a empregada a constrangimentos, seja por questões funcionais ou por mera antipatia pessoal, a ponto de inviabilizar a sua permanência no ambiente de trabalho.
Depoimento de uma testemunha confirma as alegações da autora da reclamação, apontando no sentido de que o comportamento do assediador ultrapassava o limite da normalidade, revela na sentença a juíza Tamara Gil Kemp. A testemunha afirmou ter presenciado momentos de assédio contra a colega, com gritos contra ela, e que também chegou a sofrer assédio, o que a levou, inclusive, a pedir demissão da empresa.
Além disso, salienta a magistrada, documentos juntados aos autos mostram que a trabalhadora tentou, por diversas vezes, denunciar as agressões sofridas durante o pacto laboral, mas a empresa não tomou qualquer providência quanto aos fatos apontados.
Silenciamento
A magistrada lembrou, nesse ponto, que o protocolo para julgamento com perspectiva de gênero fala exatamente que “o silenciamento de vozes dentro da organização pode levar à situação em que a violação reiterada faz com que a vítima se sinta impotente para reagir ou procurar algum tipo de ajuda”. O protocolo aponta também “a carga do estereótipo da mulher como uma espécie de ‘categoria suspeita’, baseada nas crenças de que as mulheres exageram nos relatos ou mentem e de que se valem do Direito por motivo de vingança ou para obter vantagem indevida”.
Para a juíza, pelas provas constantes dos autos, ficou evidente que o tratamento dirigido à trabalhadora ultrapassou os limites de urbanidade e respeito que devem nortear as relações trabalhistas. Nada justifica um tratamento que atente contra a dignidade do indivíduo, que antes de ser empregado, é um ser humano, lembra a magistrada, para quem não é necessário ser um indivíduo de sensibilidade aguçada para sentir-se humilhado nas situações narradas, “basta recorrer ao padrão do homem, ou melhor, da mulher média, ainda mais se gestante.”
“Neste compasso, tendo ocorrido injusta agressão por parte do preposto do empregador, suscetível de causar no empregado constrangimento e aviltamento em sua dignidade, imagem e sentimentos de pessoa humana, é justo e razoável que seja o empregador responsabilizado pelo dano moral que vitimou a obreira”, concluiu a magistrada ao deferir o pagamento de indenização por dano moral, arbitrada em pouco mais de R$ 22,5 mil – o equivalente a quatro vezes o valor da última remuneração da trabalhadora.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 10ª Região Distrito Federal e Tocantins, por Mauro Burlamaqui, 29.11.2022
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