Uma trabalhadora que atuou em um bingo como locutora e vendedora não teve seu vínculo de emprego formalmente reconhecido, mas deve receber, como indenizações, os direitos decorrentes da relação de trabalho. Isso porque, segundo os desembargadores da 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (TRT-RS), embora o contrato não possa ser formalizado porque a atividade de bingo é considerada ilícita, os efeitos da relação trabalhista devem ser reconhecidos, para que a trabalhadora não fique desamparada e a empregadora venha a se beneficiar pela não quitação.
A decisão reforma sentença do juízo da 2ª Vara do Trabalho de Pelotas. Ao julgar improcedente a ação na primeira instância, a juíza fez referência à Orientação Jurisprudencial (OJ) nº 199 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que prevê a nulidade do contrato de trabalho em atividades ligadas ao jogo do bicho, por ter o objeto ilícito. Como a atividade de bingos é considerada contravenção, a magistrada utilizou a mesma OJ, por analogia, no caso julgado, e concluiu que não poderia haver qualquer efeito do contrato considerado nulo.
Entretanto, ao analisar o recurso interposto pela trabalhadora diante desse entendimento, a relatora do caso na 1ª Turma do TRT-RS, desembargadora Rosane Serafini Casa Nova, ressaltou que o não reconhecimento dos direitos da trabalhadora acarretaria no enriquecimento ilícito do estabelecimento, além de incentivar, nas palavras da magistrada, mais uma forma de delinquência, já que o “empregador” estaria livre para contratar empregados, com a garantia de não haver qualquer ônus.
A desembargadora citou outros julgamentos proferidos pela 1ª Turma no mesmo sentido, e optou por reconhecer a relação de trabalho havida entre as partes, com seus respectivos efeitos monetários, embora o contrato seja considerado nulo por conter objeto ilícito e não possa ser registrado na Carteira de Trabalho. A relatora também determinou que as verbas trabalhistas sejam pagas como indenizações.
Ao discordar desse entendimento, o desembargador Roger Ballejo Villarinho, também integrante da Turma Julgadora, argumentou que só poderia haver efeitos em contratos com objeto ilícito naqueles casos em que o trabalhador atuava em funções não ligadas diretamente ao empreendimento, como em tarefas de segurança e limpeza. Este, segundo o magistrado, não era o caso dos autos, já que a trabalhadora era locutora e vendedora dos bingos, função essencial ao negócio.
A desembargadora Laís Helena Jaeger Nicotti, no entanto, concordou com o voto da relatora, e o entendimento foi referendado por maioria de votos. Cabe recurso do acórdão da 1ª Turma ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 4ª Região Rio Grande do Sul, por Juliano Machado, 24.08.2021
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