Conciliação foi homologada nessa segunda-feira (21) pelo Cejusc de Cuiabá; solução do caso foi celebrada diante do tamanho da dívida e da situação do trabalhador
Em fevereiro de 2015, José* precisou se afastar do trabalho para tratar de um quadro de insuficiência renal crônica, uma doença grave que muitas vezes leva à paralisia dos rins e tem como desfecho a morte da pessoa, à espera de um transplante.
Dada a severidade do caso, José não retornou ao serviço e continua afastado até hoje, recebendo o auxílio-doença concedido pelo Governo Federal por meio do INSS.
Por conta da licença para tratamento da saúde, seu contrato de trabalho foi suspenso e ele deixou de receber o salário da empresa, como determina a legislação. O plano de saúde, um benefício empresarial oferecido mediante uma contribuição descontada mensalmente em seu holerite, todavia, foi mantido.
O longo período longe do trabalho somado à falta dos descontos de coparticipação fez a dívida crescer, chegando à casa dos 50 mil reais.
Recentemente, a empresa ajuizou uma ação judicial cobrando os valores. Na audiência de conciliação, realizada de forma telepresencial pelo Centro Judiciário de Métodos Consensuais de Solução de Disputas de Primeiro Grau de Cuiabá (Cejusc), o trabalhador reconheceu a dívida e o direito do empregador em cancelar o plano e cobrar os valores, mas disse que só conseguiria pagar 300 reais por mês.
Perdão da dívida
A juíza Leda Borges, coordenadora do Cejusc, acompanhava tudo sem interferir, já que as audiências de conciliação são conduzidas por servidores/conciliadores, sob a supervisão do magistrado. Mas, nesse momento, ela entrou na sala virtual e fez o apelo para que a dívida não fosse cobrada, visto se tratar de um trabalhador enfermo, já desenganado pelos médicos, com baixa remuneração e que se mantinha com o dinheiro recebido do auxílio-doença.
A sugestão foi levada para análise da direção da empresa, que acabou acolhendo a proposta e perdoando a dívida. O acordo que encerrou o caso foi juntado ao processo e homologado nessa segunda-feira (21) pela Justiça do Trabalho em Mato Grosso.
“Quando a empresa trouxe o caso até nós, trouxe como pessoa jurídica. Mas ela é formada por pessoas e ao pedir o perdão, buscamos trazer esse lado humano para a equação”, explica a juíza. Esse, aliás, é o objetivo das audiências de conciliação realizadas pelo Cejusc, destaca a magistrada.
A advogada Valéria Baggio, que representou a empresa no processo, conta que o perdão da dívida foi um pouco de tudo, inclusive empatia. “É um dinheiro que não é bem-vindo porque vai faltar para a pessoa. O pensamento da empresa foi neste aspecto. Se podemos fazer o bem, porque não o fazê-lo?”, indaga.
Nesse caso específico, a juíza Leda Borges lembra que além da questão humanitária por trás do gesto, que tira das costas do trabalhador enfermo o peso de arcar com o pagamento de uma dívida que certamente comprometeria sua renda, também resolve questões administrativas do empregador diante da segurança que um acordo judicial traz.
A advogada Valéria, inclusive, conta que o ajuizamento da ação foi nesse sentido, em especial porque o cancelamento do plano de saúde poderia acarretar demandas judiciais futuras com pedidos de indenização por dano moral e material, algo que agora se resolve com o acordo homologado pela justiça.
Caso comum
A magistrada coordenadora de Cejusc afirma que não é incomum ações judiciais desse tipo, de empresas cobrando a coparticipação do empregado no plano de saúde nos casos em que ele deixou de contribuir após ficar afastado pelo INSS. Todavia, essa foi a primeira vez que se deparou com um caso de afastamento tão longo e com uma dívida tão alta.
Ela fez questão de elogiar a atitude do empregador, que manteve o plano de saúde por tanto tempo, o que, certamente, possibilitou ao trabalhador ter acesso a um melhor tratamento médico, mesmo estando em situação irregular.
A servidora Priscila Freitas, que mediou a audiência de conciliação, disse ter ficado emocionada com o desfecho do caso. “Para mim, foi bastante emocionante por conta do valor expressivo. O montante foi cobrado de uma só vez e o empregado/reclamado certamente não teria condições de arcar com o pagamento. Foi um gesto muito nobre e muito humano por parte da empresa”, elogia.
Pacificação
Ao comemorar a celebração do acordo e o perdão da dívida num caso tão difícil a juíza Leda Borges celebrou o momento. “Existe, atualmente, um movimento muito grande para a disseminação da cultura da paz na busca pela pacificação social. Embora a empresa tivesse esse passivo, a solução alcançada com o perdão nada mais foi que uma solução adequada. A empresa não é inumana, tem pessoas por trás. Aqui conseguimos aproximar essas pessoas para que falem das suas necessidades e juntas construam a solução mais adequada do conflito”, finaliza.
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 23ª Região Mato Grosso, 23.03.2021
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