Justiça nega pedido de indenização a vaqueiro atacado por onça no Pantanal

03 fev 2021

Um vaqueiro atacado por uma onça no Pantanal mato-grossense teve negado o pedido para que o ex-patrão fosse condenado a pagar pelos danos provocados pelo acidente.

O ataque aconteceu quando o trabalhador, empregado de uma fazenda no município de Poconé, ajudava uma comitiva a retirar o gado do local. Ao ouvir latidos, ele foi verificar o que chamava a atenção dos cães e se deparou com o animal selvagem, que estava acuado e comendo um bezerro.

Ele contou que nesse momento tentou tomar o animal da onça, que o atacou e mordeu suas mãos, sendo salvo pela única pessoa nas proximidades, o chefe da comitiva, que usou uma faca para enfrentar o felino. Com as mãos machucadas, uma delas com fratura exposta, o vaqueiro foi socorrido e levado de caminhonete até um hospital em Rondonópolis.

Na Justiça, ele sustentou que era dever do patrão arcar com a reparação pelos danos por não ter tomado qualquer providência para minimizar os riscos, mesmo sendo comum o aparecimento de onças na região. Argumentou ainda que, independentemente da culpa pelo ocorrido, o empregador estaria obrigado a assumir os prejuízos em função do risco da atividade, com base na responsabilidade objetiva, a ser aplicada nos casos em que o dano é potencialmente esperado em razão da natureza dos serviços que demandam um grau de risco superior ao que está sujeita a maioria das pessoas em seu cotidiano.

Mas, sentença proferida na 7ª Vara do Trabalho de Cuiabá isentou o empregador de arcar com as indenizações pleiteadas ao concluir que o acidente ocorreu por culpa do próprio trabalhador, que foi imprudente diante do perigo.

O vaqueiro recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso (TRT/MT) questionando a decisão de que a culpa pelo acidente foi exclusivamente sua. Ele se justificou dizendo que a reação que teve foi natural e instintiva para tentar salvar o bezerro das garras da onça.

A relatora do recurso, desembargadora Beatriz Theodoro, afastou a aplicação da responsabilidade objetiva ao caso com base na função de vaqueiro exercida pelo trabalhador, já que não se trata de acidente relacionado com os animais da fazenda, ou seja, inerente à atividade.

Ela reconheceu que a expansão pecuária faz com que a atividade rural ocupe o habitat natural de animais silvestres, sendo comum casos de abate de animal de criação das fazendas por onças, sobretudo na região pantaneira, mas que é inusitada a notícia de que tenha havido ataque de onça a vaqueiros no exercício de sua atividade.

Quanto à justificativa do trabalhador, a única testemunha do acidente afirmou que ao se darem conta da presença do felino, ele já havia comido o bezerro, não se sustentando, assim, a narrativa de que teria agido por um impulso heroico na tentativa de salvar o animal de propriedade de seu empregador.

Também ficou comprovado que não havia ordem ou orientação para que os empregados matassem ou afugentassem onças que estivessem atacando o rebanho e, conforme registrou a relatora, “tampouco, se poderia entender que estivesse dentro do leque de atribuições do autor na função de vaqueiro.”

Imprudência

Assim, a 2ª Turma concluiu, por unanimidade, que o acidente não decorreu de ato ilícito do empregador, mas de culpa exclusiva do trabalhador que agiu de forma imprudente e por sua iniciativa, ao se aproximar de um animal selvagem, acuado pelos cães e, com as próprias mãos nuas, tentou retirar a caça da qual o animal se alimentava.  “Ora, pertence ao homem médio o conhecimento que se até mesmo o animal doméstico por vezes se torna agressivo e morde as mãos do próprio tratador que tenta afastá-lo do seu comedouro, tanto mais o selvático admitirá que se lhe retire a caça abatida”, ressaltou a relatora.

Por fim, a Turma registrou que não se sustenta a alegação do vaqueiro de que teve uma reação instintiva diante da prova que ele foi insistentemente advertido pelo chefe da comitiva para que não fosse até onde a onça se encontrava. Além disso, o animal estava longe do rebanho e o trabalhador teve de se deslocar ao encontro do felino, o que não deixa dúvida de que foi consciente a decisão de praticar o ato que lhe causou os danos.

Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 23ª Região Mato Grosso, 01.02.2021

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