A 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TRT/RJ) deu provimento ao recurso ordinário de um servente que reivindicava a nulidade de seu contrato de trabalho voluntário com o município do Rio de Janeiro. O profissional alegou que as características de sua prestação de serviço correspondiam a uma relação formal de emprego. Na segunda instância, o relator do acórdão, desembargador Marcelo Augusto Souto de Oliveira, entendeu ter ocorrido admissão de servidor público sem prévia aprovação em concurso público, nem excepcionalidade que a justificasse, prevista pela Constituição Federal em casos emergenciais.
Em sua ação, o servente alegou que foi contratado em março de 2011 para trabalhar de segunda a sexta-feira, das 8h às 17h, em regime de mutirão no “Projeto Reflorestamento” do Sandá/Parque Leopoldina, no bairro de Bangu, Zona Oeste do Rio de Janeiro. Informou que recebia um salário inicial de R$ 668,20, sob a denominação “ajuda de custo”, sem registro na Carteira de Trabalho e Previdência Social (CTPS). Dispensado em 17/1/2018, alegou que o contrato de trabalho voluntário era fraudulento, pois cumpria horário, recebia salário fixo e tinha que responder a um encarregado, elementos que caracterizam uma relação formal de emprego, e não de trabalho voluntário. Por isso, requereu o cumprimento do disposto na Súmula n° 363 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que reconhece o princípio constitucional da nulidade do contrato quando celebrado com ente público sem o obrigatório concurso público. Nestes casos, a norma do TST garante a justa contraprestação pela força de trabalho e os depósitos do FGTS.
Em sua defesa, a prefeitura declarou que o trabalhador participou de um projeto de mutirão desenvolvido com a ajuda do município para obras e reflorestamento de encostas em comunidades carentes da cidade. Segundo o ente público, quando autorizado o início das atividades, um encarregado foi eleito pela associação de moradores local para ser o responsável pela execução do serviço e pela formação da equipe, selecionando os trabalhadores, preferencialmente, entre os desempregados e residentes da região. Informou também que são as associações de moradores que definem as atividades de que necessitam.
Na 69ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro, onde o caso foi apreciado em primeira instância, o juízo esclareceu que, embora tenha alegado a nulidade do contrato voluntário, o trabalhador estava ciente da impossibilidade de se reconhecer a relação de emprego pela ausência do concurso público, o que de fato leva à nulidade da contratação. Segundo entendeu o juízo, é incontroverso que o reclamante aderiu ao contrato voluntário, além de o servente não ter juntado aos autos provas suficientes para a tipificação da fraude. “Competia à parte autora a prova dos fatos constitutivos do direito alegado. Descuidou-se. Não há prova de vício de consentimento e tampouco de que o contrato preenchesse os requisitos configuradores da relação de emprego”. Por esses motivos, o juízo rejeitou o pedido de nulidade do contrato voluntário e indeferiu o pedido de indenização, equivalente aos valores não pagos do FGTS. Inconformado com a decisão de primeiro grau, o trabalhador interpôs recurso ordinário.
Em segunda instância, o relator do acórdão citou a Lei do Trabalho Voluntário (9.608/98), que define a modalidade de serviço como atividade não remunerada, prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou instituição privada, de fins não lucrativos, que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência social. O magistrado explicou que basta estar ausente um desses requisitos para afastar automaticamente o conceito de trabalho voluntário, observando que o trabalhador não apresentou qualquer documento que pudesse aferir a natureza do contrato.
Porém, o magistrado constatou que, além de oneroso, o contrato comportou os demais requisitos que regem a relação formal de emprego, como pessoalidade, habitualidade e subordinação jurídica, esta última por haver encarregado responsável pelo serviço e escolha da equipe. Lembrou que o réu é ente público, e que a investidura em cargo ou emprego públicos depende de aprovação prévia em concurso público, de acordo com o artigo n° 37 da Constituição Federal. Segundo o desembargador, a Carta Magna admite exceção apenas em situações temporárias de excepcional interesse público. O relator do acórdão ressaltou não ser este o caso, pois a contratação não decorreu de situação anormal e durou cerca de sete anos. Acrescentou também que nenhuma lei municipal prevê contratação de temporários para a função de agente ambiental ou similar.
“É certo que a fraude perpetrada pelo réu configura verdadeira admissão de servidor público sem prévia aprovação em concurso, já que inexistentes os pressupostos para a contratação por prazo determinado. Em virtude disso, tem-se por nulo o contrato mantido entre as partes, por violação ao inciso II do artigo 37, da CRFB”, decidiu o relator do acórdão, reformando a sentença e deferindo indenização correspondente aos depósitos do FGTS de todo o período contratual.
Nas decisões proferidas pela Justiça do Trabalho, são admissíveis os recursos enumerados no art. 893 da CLT.
0101024-45.2019.5.01.0069 (ROT)
Fonte: Tribunal Regional do Trabalho 1ª Região Rio de Janeiro, 26.10.2020
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